Os
primeiros achados arqueológicos do uso da planta da coca, indicam que seja há
pelo menos cinco milénios no Equador e Peru. A partir do século XI, surge na
civilização Inca, onde acreditam que a planta tinha um poder divino, sendo
associada a religião e política. Mas seu maior uso era entre os trabalhadores
que ao consumirem a planta sentiam fome, sede e cansaço diminuídos.
No
século XVIII, a coca chega à Europa, mas só em 1859 Albert Neiman isola o seu
princípio ativo responsável pelos efeitos da planta. Terapeuticamente a cocaína
foi rapidamente comercializada e utilizada como remédio para os nervos, para
curar a tristeza e a melancolia e para o tratamento do aparelho fonador.
Com
a descoberta da fórmula da cocaína assiste-se a um amento abrupto do prestígio
clínico e social da droga que passou a ser utilizada na elaboração e formulação
de remédios e tónicos utilizados para tratar um largo leque de doenças.
Para
surpresa de alguns, o pai da psicanálise Sigmund Freud fez estudos sobre a
cocaína em 1885, com o nome de “Über Coca” nessa pesquisa Freud conta a
história da cocaína na utilização dos homens e animais, e também suas
utilizações terapêuticas. O objectivo de Freud era observar os efeitos da coca
no organismo. Conforme relata na sua pesquisa:
“Alguns
minutos após ingerir a cocaína, experimentam-se súbita exaltação e uma sensação
de leveza. Os lábios e o palato ficam saburrosos, seguindo-se sensação de calor
nas mesmas áreas. Em outras ocasiões, a sensação predominante é um frescor
bastante agradável na boca e na garganta. Durante esse primeiro teste,
experimentei um curto período de efeitos tóxicos, que não reapareceram em
experiências subsequentes. A respiração ficou mais lenta e profunda, e
sentia-me cansado e sonolento; bocejava com frequência, sentindo-me um tanto
apático. Após alguns minutos, começou a euforia real da cocaína, iniciada por
repetida eructação refrescante. Imediatamente após tomar cocaína, notei um leve
retardamento do pulso e, mais tarde, um aumento moderado.”(Freud, 1885 apud Byck,
1989, p. 73).
Freud
comenta que o uso da cocaína na apresenta diversas funções para os sujeitos.
Podendo funcionar como estimulante, ao aumentar a capacidade física do corpo
por um determinado e curto tempo, ou no tratamento de distúrbios digestivos, da
caquexia (degeneração de tecidos), do vício da morfina e do álcool, e da asma.
Ele comenta ainda o uso da cocaína como afrodisíaco: “Entre as pessoas a quem
administrei a coca, três relataram violenta excitação sexual, prontamente
atribuída a ela” (Freud, 1885 apud Byck, 1989, p. 78), e com fins de obter
efeito analgésico.
Segundo
Mendonça (2012) Ao fim desse estudo, Freud constata que os sintomas subjectivos
dos efeitos da cocaína são diferentes para cada pessoa e que a acção da cocaína
é indirecta, efetuada por meio de uma melhora na condição do bem-estar. Com
isso, se com o uso de cocaína obteve sucesso em relação aos efeitos
terapêuticos analgésicos e anestésicos, que permitiram a realização de diversas
cirurgias, também demonstrou o fracasso dessa prática, que conduzia ao vício,
aos efeitos de intoxicação e até mesmo ao apagamento do inconsciente.
Observamos, em nossa prática clínica, que as formações do inconsciente (lapsos,
actos falhos, sonhos) estão, em sua maioria, ausentes nos sujeitos neuróticos que
fazem o uso abusivo de drogas. Esses sujeitos, que nada querem saber da divisão
subjectiva, acabam se afastando da realidade, do convívio social, do trabalho,
da família, por causa da ilusão de que a droga lhes proporciona a felicidade e
a completude.
Formas de Consumo da Cocaína
Segundo
Ganeri (2002) as formas de consumo da cocaína são várias:
1
– As folhas de coca podem ser mascadas ou utilizadas na preparação de infusões
orais, sendo neste caso uma absorção lenta.
2-
Do primeiro processo de extracção da cocaína a partir das folhas de coca
resulta o sulfato de cocaína (pasta de coca) que pode ser fumado. Neste caso a
velocidade de absorção é bastante rápido.
3-
O Cloridrato de cocaína, um sal formado por adição de ácido clorídrico pode ser
administrado por via intra-nasal ou intravenosa e a sua absorção é rápida.
4-
A base de cocaína ou “free base” obtida pela mistura do cloridrato de cocaína
com uma solução base como o bicarbonato de sódio é dissolvida em éter.
Efeitos
da Cocaína no Organismo
A
cocaína conduz rapidamente à habituação e o consumidor dependente entra em
desespero se não repetir o uso da droga. Os sintomas mais comuns de privação de
cocaína são o desejo insaciável da mesma, irritabilidade, alterações no apetite
e no sono, falta de energia física e mental, desmotivação e depressão.
Segundo Aragão e Sacadura (2002, p. 47) A acção
deste estupefaciente sobre o cérebro é grave pelas alterações que desencadeia
em três receptores fundamentais:
a)
Neropinefrina- Ao bloquear este receptor químico, pode desenvolver-se no
consumidor taquicardia, hipertensão e vasoconstrição, diaforese e tremores
discretos, podendo estes numa situação de “overdose” generalizarem-se a todo o
corpo sem contudo configurarem um estado de ataque epiléptico.
b)
Dopamina- Afectado este receptor o sujeito consumidor de cocaína pode
desenvolver o quadro comportamental esperado do produto: comportamento
estereotipado, hiperatividade e excitação sexual, mas o consumo regular,
geralmente conduz a efeitos contrários como impotência sexual e inibição para
ter orgasmos. Uma das complicações mais graves do uso da cocaína é a propensão
para o desenvolvimento de uma psicose que em muitos casos não se distingue e se
confunde com a esquizofrenia.
c)
Seretonina- A acção da cocaína sobre este receptor (5-hidroxitriptamina) conduz
normalmente à redução dos seus metabolitos e da sua concentração.
Consequentemente regista-se no consumidor de cocaína uma diminuição da
necessidade de dormir já que a serotonina intervém no ciclo do sono (Filipe de Sousa).
Referências
Bibliográficas
Aragão,
M. J. e Sacadura, R. Guia Geral das Drogas: explicar o seu mecanismo e as suas
consequências. Lisboa: Terramar. 2002.
Byck,
R. Freud e a cocaína. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo. 1989.
Ganeri,
A. Drogas: Do êxtase á agonia. Men Martins: Publicações Europa América. 2002.
Gonçalves,
Artur . Álcool, tabaco e outras drogas: concepções de professores e alunos o
ensino básico e secundário e análise de programas e manuais escolares. Tese de
Doutoramento. Universidade do Minho, 2008.
REIS
DA SILVA MENDONCA, Júlia. A droga como um recurso ao mal-estar na civilização.
Psicol. rev. (Belo Horizonte), Belo
Horizonte, v. 17, n. 2, ago.
2011 . Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-11682011000200006&lng=pt&nrm=iso>.
acessos em 09 jul.
2013
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